(publicado na revista ITINERÁRIO, Coimbra/
Portugal , 1969)
Fim dos anos sessenta, no Nordeste do Brasil.
No roteiro do turista que passe por estas plagas
, uma visita á cidade de Nova Jerusalém é obrigatória.
Saindo do Recife, ele atravessará a Serra das
Russas, passando por Gravatá ( conhecida como a
Suíça pernambucana) e por Caruaru, terra do famoso ceramista mestre Vitalino, que modelou os
tipos característicos da sua terra. Mais alguns quilômetros de cactos e
mandacarus e sentirá a fusão do calor e do silêncio, num mundo exótico
e surpreendente. Pedras agudas formam os montes. A terra é seca e
arenosa. Arbustos são a única nota verde-cinza
e o sol cai à vontade sobre toda a paisagem, sem sombra que o detenha:
eis Fazenda Nova, lugar cujo mérito, até alguns nos atrás, era possuir águas
alcalinas.
O turista
decepciona-se: então, percorreu léguas e léguas para encontrar uma estaçãozinha
de águas e um hotel cuja única beleza consiste numa piscina onde andorinhas
descem para se banhar?
Prossegue viagem. Envereda por caminhos de cabras. Chega à muralha de
Nova Jerusalém e contempla a
concretização de uma utopia.
A UTOPIA DE PLÍNIO PACHECO
Foi Epaminondas Mendonça quem jogou a primeira
semente do sonho. Leu numa revista que,
numa vila da Baviera, durante a Semana Santa, a Paixão de Cristo era encenada
nas ruas pelos seus habitantes. A ideia de fazer algo parecido em Fazenda Nova
surgiu e não o abandonou. Assim, em 1950, nas tortuosas ruas da pequena cidade,
aconteceu a primeira representação do Drama do Calvário,
com um elenco heterogêneo, composto pela família do próprio Epaminondas, e por
lavradores e carregadores de água da região.
A encenação alcançou um realismo impressionante.
Repetida nos anos seguintes, logo se tornou tradição. E, em 1962, mil e
duzentos espectadores invadem Fazenda Nova, deslocando-se atrás dos atores que
ressuscitam a epopeia cristã.
Já então um plano fantástico se delineava na
mente de Epaminondas: reconstituir uma Jerusalém semelhante o mais possível à
da época de Jesus, com o objetivo de dar ao espetáculo condições de máxima
realidade.
O homem capaz de se embrenhar nessa aventura
teria de ser um visionário ou um romântico, um bandeirante ou um bravo. E ele
surgiu na pessoa de Plínio Pacheco :
casando-se com uma filha de Epaminondas Mendonça, logo abandonou a farda da força Aérea
Brasileira, despediu-se do barulho das redações dos jornais e foi morar em
Fazenda Nova.
DO PROJETO À REALIDADE
Adquirindo o terreno de 70.000m2 ( um terço da
área murada da velha Jerusalém), cactos e pedregulhos foram dando lugar a
edifícios e casas no estilo da época de Cristo. Com base em pesquisas
históricas e plantas feitas, entre outros, por Ana Gonçalves, Walter Macedo,
Frederico de Holanda, Ubirajara Galvão e pelo próprio Plínio Pacheco, o projeto
que parecia irrealizável foi se transformando em sólida realidade de granito.
No momento ( 1969) construíram-se já os palácios de Asmoneus e o de Herodes, o Forum de Pilatos, o templo, o
tribunal de Caifás, o Cinédrio e o cenáculo. Ao lado deles, surgiram os
arruados da Via sacra e, nos arredores, réplicas do Monte das Oliveiras, Fonte
das Virgens e Santo Sepulcro.
Este palco de sete hectares – hoje o maior palco
ao ar livre do mundo – será fechado por uma muralha de pedra bruta, com sete
portas, das quais, uma já concluída, serve de entrada para o recinto.
Plínio Pacheco, que passa o dia numa das casas do
arruado da Via Sacra, recebe o visitante, oferece-lhe água e sucos, e tem gosto em contar a história de Nova
Jerusalém.
Foi aí que me recebeu e me contou tudo o que escrevo neste texto,
explicando que os edifícios construídos não servirão apenas como palco do grandioso espetáculo
anual. Em breve, periodicamente, ali acontecerão festivais de teatro grego, de dança, de canto
coral, de cinema. Também pretende
movimentar cursos, conferencias e exposições. Tudo isso visando tornar Nova
Jerusalém um centro atuante de cultura, dinamizado por uma colônia de férias,
que aproveitará as próprias casas e palácios da cidade-teatro, propiciando a
artistas, jornalistas e gente ligada à cultura uma hospedagem paga, em parte,
com exposições de seus trabalhos e promoção de cursos e conferencias.
Por outro lado, o aspecto social não foi
esquecido: atualmente uma escola para crianças funciona no palácio de Asmoneus,
mas, no futuro, serão instaladas escolas artesanais e de alfabetização de
adultos.
O ESPETÁCULO PROPRIAMENTE DITO
Desde aquela representação despretensiosa de 1950
até hoje, o espetáculo cresceu muito. Nele colaboram centenas de pessoas, desde
técnicos, atores, um coral de 50 vozes, um conjunto de danças clássicas e
extras requisitados entre os habitantes da cidade. Os figurantes, cerca de
quinhentos, envergam um guarda-roupa especialmente desenhado e confeccionado
para a peça.
O desenvolvimento das cenas tem início na
quinta-feira á noite, com o Sermão da Montanha. Os espectadores, por 3 horas,
seguem os atores e os extras e a eles se misturam, no Templo, no Cenáculo, no
Horto, no tribunal de Caifás.
Na sexta-feira, também à noite, o espetáculo
prossegue, desde o Forum de Pilatos até o Calvário, onde se assiste, num
ambiente trágico, à crucificação de Jesus, terminando com a grandiosidade da
ressurreição.
CONVITE
Quando passar pelo Recife, mesmo que não seja
época de Semana Santa, não deixe de atravessar o agreste pernambucano para conhecer a Nova Jerusalém. Lá encontrará um
homem com pele de bronze e pulso de ferro. De bermudas e chapéu de palha, confunde-se com os operários que,
indiferentes à inclemência do sol, com suas ferramentas primitivas, arrancam da
pedra os capitéis do sonho: trata-se de Plínio Pacheco, uma espécie de profeta
moderno, que lhe abrirá a sua Nova Jerusalém, exemplo de persistência, de fé e
de milagre.
Nota
da autora: da época em que o artigo acima foi escrito, até
hoje, muita coisa mudou em Nova
Jerusalém. Por exemplo: atualmente o espetáculo
ocorre num só dia, repetindo-se de quinta a domingo; em geral tem como ator principal um astro das novelas
da TV, que se renova todos os anos.
Abaixo , como atualização, transcrevo
algumas informações, recolhidas no
site de Nova Jerusalém.
NOVA JERUSALÉM NO SÉCULO XXI
Constituída por nove palcos, em uma área de 100
mil m², cercada por uma muralha de 3.500 m e 70 torres, Nova Jerusalém
corresponde a um terço da Jerusalém original, onde Jesus viveu seus últimos
dias.
Idealizada e construída por Plínio Pacheco, a cidade-teatro está localizada no distrito de Fazenda Nova, no município de Brejo da Madre de Deus, a 180 km do Recife, capital pernambucana.
Assistido por mais de dois milhões e meio de pessoas, com um público médio diário de 8.000 e conseguindo atingir a marca de 72.000, no aniversário de 40 anos, o maior teatro ao ar livre do mundo encanta turistas nacionais e internacionais pela estrutura e semelhança com a Judéia dos tempos da dominação romana.
Os palcos reproduzem os cenários naturais, os arruados, o Palácio de Herodes, o Fórum de Pilatos, o Templo de Jerusalém e o Cenáculo, constituindo uma obra monumental. Tudo é grandioso, encantador e inesquecível.
O requinte dos detalhes, a beleza plástica e a qualidade impressionam o público que, a cada ano, lota os espetáculos.
Idealizada e construída por Plínio Pacheco, a cidade-teatro está localizada no distrito de Fazenda Nova, no município de Brejo da Madre de Deus, a 180 km do Recife, capital pernambucana.
Assistido por mais de dois milhões e meio de pessoas, com um público médio diário de 8.000 e conseguindo atingir a marca de 72.000, no aniversário de 40 anos, o maior teatro ao ar livre do mundo encanta turistas nacionais e internacionais pela estrutura e semelhança com a Judéia dos tempos da dominação romana.
Os palcos reproduzem os cenários naturais, os arruados, o Palácio de Herodes, o Fórum de Pilatos, o Templo de Jerusalém e o Cenáculo, constituindo uma obra monumental. Tudo é grandioso, encantador e inesquecível.
O requinte dos detalhes, a beleza plástica e a qualidade impressionam o público que, a cada ano, lota os espetáculos.
OBS: in NOS BASTIDORES DA POESIA ( livro inédito,
reunião de textos críticos e outros temas de Maria de Lourdes Hortas)
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