sábado, 7 de fevereiro de 2015

A RESSONÂNCIA NA POESIA DE JUAREIZ CORREYA




Natural de Palmares, Pernambuco, Juareiz Correya  nasceu em 1951, mas  radicou-se no Recife  desde 1970 , onde, através da sua editora Nordestal, publicou a revista POESIA, divulgando não  só autores nordestinos, mas de vários estados do Brasil. Vem daí o seu incansável, contínuo  e importante trabalho como promotor cultural, criando e realizando   eventos literários  e  dedicando-se, sistematicamente,   à divulgação da obra de dois importantes nomes de conterrâneos seus:  Ascenso Ferreira e  Hermilo Borba Filho.

Entre 1987 e 2003 voltou a Palmares, onde, à frente da  Casa da Cultura Hermilo Borba Filho, com o apoio da Prefeitura de Palmares,  realizou  significativo trabalho cultural . 
A  breve  informação biográfica, parece-me necessária para  traçar o perfil de  Juareiz Correya, cuja  vida caminha paralela à sua  poesia e vice-versa. Vibrante, tudo o que este poeta escreve reflete a sua experiência vital : seus poemas são imprevisíveis, e sua linguagem , visceral.

Estas reflexões me vêem após a releitura do livro de Juareiz Correya  Americanto Amar America e outros poemas do século 20. - Panamerica Nordestal Editora,Recife, PE, 2010 –oportuna reunião de tudo o que o autor já publicou, quer em forma de livro, quer como simples folhetos de cordel, e creio que  mais alguns  poemas inéditos até a presente edição.
Sem qualquer intenção crítica,  pois para tal  são necessárias ferramentas de que não disponho, ao traçar estas breves linhas, interessa-me apenas fixar algumas  impressões da  minha leitura, por me parece importante , de alguma maneira, divulgar um autor que  tem  dedicado toda a sua vida à poesia, quer como criador, quer como editor.

 A sintonia entre leitor e autor ocorre quando o poema provoca em quem o lê um encontro , ou seja,  um  aprofundamento que vai confirmar a ressonância a que se refere Gaston Bachelard : “o poema nos toma por inteiro” (...) “como se, com sua exuberância, o poema reanimasse profundezas do nosso ser”.

Fico pensando: quantas vezes  a leitura de um poema se desdobra  em nós numa nova criação? .
 O professor Massaud Moisés,  crítico e profundo conhecedor da literatura, já disse que “ a arte literária não se reduz ( ou não deve reduzir-se) a uma forma banal de entretenimento”.  E prossegue:” (...) mais do que recreação de alto-nível, a Literatura constitui uma forma de conhecer o mundo e os homens: dotada de uma séria missão , colabora para o desvendamento daquilo que o homem, conscientemente ou não, persegue durante toda a existência”.
Esta  definição me parece  justa e precisa  no caso da  poesia de J. Correya. Tudo o que ele escreve  é a expressão de sua vida, a superação e a libertação do seu cotidiano, o  reflexo do seu  tempo , e, como consequência, o registro do  ser  humano, onde quer que esteja e em que  geografia habite.
Veja-se, por exemplo, este  poema:

Amo só o que conheço, nada é perdido.
O bairro onde vivo e seus arredores.
Os homens de hoje, mesmo os que decepcionam,
sem mito e esplendor,
humanamente humanos.
As obras definidas que acabo de ler.
A leitura, não a saudade, da poesia do mundo.
O Ocidente e o Oriente que, na verdade,
existem sob o sol para todos.  
Os mais velhos, com quem converso
as horas de suas saudades. 
As múltiplas formas da memória,
que não se faz do esquecido.
A língua que falo e as leituras que decifro. 
Todos os versos de que me lembro, mesmo por hábito.
Os amigos que não faltam, porque nunca morrem.
A ilimitada eternidade da Arte. 
A mulher que está ao meu lado,
companheira indivisível. 
Até mesmo o que não sei, como o xadrez e a álgebra. 
( in  América Indignada Y Poemas da Alegria da Vida 
- Panamerica Produções / Nordestal Editora, São Paulo / Recife, 1991)

Carlos  Drummond  de Andrade, num dos seus poemas mais conhecidos,  declarou: “Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo”. No poema de Juareiz  acima transcrito, percebemos que, também ele , não oculta o  seu  “  sentimento do mundo”: O bairro onde vivo e seus arredores. /Os homens de hoje, mesmo os que decepcionam, /sem mito e esplendor, humanamente humanos.

A  imensidão interior do poeta com  frequência aflora nos seus poemas. Veja-se, por exemplo, este fragmento do poema Flor que não se cheira, do conjunto Outros Poemas  no livro em questão:

(...) e saio de mim e me entrego tanto/vendaval no coração da cidade/cada vez mais nu e louco e santo/só minha paixão por tudo arde(...) cada vez mais alto e largo e fundo/navego meu rio, capricho meu barro/voando meu fogo purifico o mundo.

No pórtico de um novo século, Juareiz Correya não se deixa embalar pelo marasmo do pós-modernismo, onde muito pouco aconteceu de renovador na poesia universal. Lendo sua obra sente-se que ele desafia o seu tempo, fugindo ao   tédio de  hábitos e formas rotineiras, sem, todavia, desprezar as vozes dos grandes e eternos  mestres da poesia.

 Era nisso também  que eu pensava quando falei em ressonância: porque, pelas estradas de Juareiz Correya, neste seu Americanto Amar América e outros poemas do século XX,ouço ecos de poetas inesquecíveis (Lorca, Neruda,Octavio Paz, F. Pessoa, Ginsberg  e  tantas outras vozes marcantes) , que têm  contribuído para o canto renovado  de muitos bons poetas contemporâneos: este, inclusive.

(Texto inédito, escrito em Aldeia ,nos arredores do Recife, 2011)







Um comentário:

  1. Excelente texto sobre o poeta Juareiz Correya. Concordo com tudo o que você diz sobre ele, e acrescento: É um homem que tem vivido a sua profissão de poeta, mais do que de escritor e editor, cotidianamente, como um evangelizador persistente e obstinado. parabéns pela sua lucidez, amiga. E pela oportunidade de aqui registrar este comentário.

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